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POLÍTICA

À CONVERSA COM O PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA MUNICIPAL DE LAGOA

“Há deputados municipais que não fazem o trabalho de casa”

Águas da Cruz reconhece que tem havido quebras de situações de disciplina em sessões, atribuindo tal ao “desconhecimento de algumas regras procedimentais” e à “falta de preparação” de deputados.

Como avalia o seu papel de presidente da Assembleia Municipal de Lagoa? É complicado e exige muita preparação?

Não é um papel complicado, mas é exigente. Por um lado, temos de elaborar a ordem de trabalhos de cada uma das sessões da Assembleia Municipal e prepará-la com um estudo exaustivo de toda a documentação, ver as soluções jurídicas que se enquadram a cada situação em concreto, as questões que vão ser submetidas a votação e a forma como são produzidas as deliberações. Toda essa matéria tem de ser preparada antes de uma assembleia. Durante a sessão, o presidente tem de disciplinar os trabalhos, no respeito pelo regimento e com observância do princípio do contraditório, para que todas as forças políticas tenham possibilidade de se exprimir e contribuir para uma boa deliberação. É assim que entendo que deve funcionar uma assembleia municipal. Sinto-me confortável como presidente da Assembleia Municipal e duplamente legitimado, pelos cidadãos e pelos meus pares que em mim votaram.


Águas da Cruz, presidente da Assembleia Municipal de Lagoa, explica a importãncia que este órgão autárquico pode ter para a vida dos cidadãos

Já houve alguma sessão em que se sentisse desiludido ou até com vontade de abandonar?
Não. O que tem havido, pontualmente, são situações de indisciplina, que atribuo ao desconhecimento do regimento e de alguns princípios básicos de funcionamento de uma assembleia municipal.

Para que servem em concreto moções ou propostas de recomendação de forças políticas sobre temas como, por exemplo, a situação na Grécia ou conflitos mundiais?
As moções e propostas de recomendação são formas de uma assembleia se manifestar e tomar posição sobre determinados assuntos de interesse geral. As moções, de preferência, devem tratar questões que interessam às pessoas de uma determinada comunidade, de uma certa zona geográfica. Nada impede, porém, que as moções tratem de assuntos internacionais, o que não deixa de fazer sentidonum mundo cada vez mais global. O que por vezes acontece é que os temas das moções não são os mais apropriados.

Ou, quando o são, são apresentadas pela mesma força política (há muitos casos desse tipo) em todos os orgãos emque está representada, desde a assembleia de

freguesia, passando pela assembleia municipal, até à assembleia intermunicipal. A moção acaba por se banalizar e perder interesse.

Admite que, muitas vezes, uma assembleia municipal perde bastante tempo com temas que não conduzem a resultados práticos nem dizem respeito ao próprio concelho?
Essas situações são próprias de assembleias democráticas. Os deputados municipais têm o direito de utilizar os instrumentos regimentais ao seu dispor. Agora, cada um dos grupos é que tem de fazer a ponderação se é adequada a moção, se o assunto é relevante e se quer usar o tempo que tem disponível no período antes da ordem do dia para apresentar essa moção.

Acha relevante a apresentação destas moções?

Entendo que as moções são tão ou mais pertinentes quando tratam de assuntos que dizem diretamente respeito às pessoas a que se dirigem, nomeadamente assuntos de carácter local e regional. Isto, porque há outros fóruns, a nível nacional e internacional(como por exemplo o Parlamento Europeu), para tratar de questões internacionais. Acho que moções e propostas de recomendação na Assembleia Municipal de Lagoa devem preferencialmente dizer respeito a este concelho e ao Algarve. E devem, acima de

tudo, ser questões relacionadas, por exemplo, com a saúde, com as acessibilidades, com os transportes e toda uma multiplicidade de

temas de âmbito local e regional.

E como avalia as intervenções do público no período antes da ordem do dia?
A intervenção do público merece todo o meu respeito. É uma forma de participação dos cidadãos na vida pública. O que registo é uma fraca adesão de público e de participação dos munícipes nas assembleias municipais, mesmo



“Registo uma fraca participação das pessoas nas assembleias, mesmo quando estas são descentralizadas”


quando as sessões são descentralizadas nas freguesias e os temas tratados dizem respeito às localidades onde as sessões têm lugar. Por outro lado, assiste-se, por vezes, à apresentação de assuntos relacionados com problemas pessoais, que apenas dizem respeito ao própio e que pouco interesse têm para a comunidade.

Como interpreta essa fraca afluência do público? As pessoas deixaram de acreditar nos órgãos autárquicos?
Não interpreto dessa forma, até porque as autarquias são quem estão mais perto dos cidadãos e e a quem se dirigem em primeiro lugar para resolver os seus problemas. O que há é algum desinteresse dos cidadãos na vida política geral. A fraca afluência do público também poderá ser interpretada como uma manifestação de concordância com a governação do concelho. Quando as pessoas não concordam com alguma coisa, movimentam-se, mobilizam-se e protestam, o que não aconteceu neste mandato. Quando há uma relativa paz social, chamemos-lhe assim, as pessoas têm menos interesse. Isto tem muito a ver com a nossa cultura cívica.

E o que pode ser feito para tornar as assembleias mais apelativas e mais participadas por parte do público?
Não é fácil responder a essa questão. Na Assembleia Municipal de Lagoa, considero que as intervenções na sua generalidade são qualificadas. As pessoas dominam os assuntos e expõem-nos com clareza. Por vezes, as sessões até têm muita vivacidade, o que devia constituir um fator de estímulo para que as pessoas assistam. Julgo que é relevante trazer as pessoas à assembleia e preferencialmente ir ao seu encontro. Já no outro mandato que fiz, criámos ‘a assembleia municipal em movimento’, que é a possibilidade de levar a efeito sessões deste órgão nas freguesias, precedidas de uma visita a essas zonas do concelho, de preferência contactando diretamente com as populações. Neste mandato, já realizámos assembleias municipais descentralizadas no Parchal e em Carvoeiro, localidades que foram agregadas como freguesias, a que se seguiu Ferragudo. No mês de setembro, vai ser a vez de Porches.

Há deputados que não sabem qual o seu papel numa assembleia municipal?
Não posso fazer esse julgamento. Quem o terá de fazer são os partidos quando selecionam as pessoas para as integrar nas listas. O que entendo é que as pessoas se deveriam preparar para o desempenho de um cargo para o qual foram eleitas e que têm obrigação de corresponder às expectativas dos eleitores que as elegeram. Mas, sim, alguns têm falta de preparação técnica. Há deputados que, por vezes, não fazem o trabalho de casa.

O que recomendaria em Lagoa ao atual executivo camarário?
Ao atual executivo não faço recomendações pela comunicação social… Faço-as diretamente, e nos locais apropriados ao senhor presidente da Câmara Municipal de Lagoa, com quem mantenho uma excelente relação.

Como sente o concelho? Quais os aspetos positivos e negativos?
Sinto que este concelho está a mexer. Sinto que há uma capacidade para atrair investimentos, o que se revela nalguns que já viram a luz do dia e outros que a verão em breve. Destaco, por exemplo, a instalação de uma grande superfície comercial, como é o caso do supermercado Apolónia, a abertura de duas unidades hoteleiras, o Sol Férias e o Motel Alagoas, que devem abrir brevemente, além de outros investimentos que serão oportunamente anunciados. Tal significa a capacidade e o poder de atração que o concelho de Lagoa tem em relação a outros concorrentes.
Gostaria ainda de salientar o estímulo que está a ser dado pelo Município ao empreendedorismo, nomeadamente através das escolas, com trabalhos extremamente meritórios de alunos, incluindo os dos cursos profissionais. Temos uma nova geração em que podemos confiar no futuro de Lagoa.

E os aspetos negativos?
Têm a ver com o elevado desemprego e pobreza. Há 30 ou 40 famílias em situação de pobreza extrema no município, resultante do desemprego, da idade avançada e de doenças crónicas. No primeiro trimestre de 2015, tínhamos 1612 desempregados, em maio tinha baixado para 1217, já fruto da sazonalidade turística. E em finais de junho, o desemprego andará na ordem dos 800 desempregados no concelho. A partir de outubro, infelizmente, voltará a subir. Por outro lado, há cerca de 200 famílias com rendimento social de inserção. E nota-se o envelhecimento da população em Porches, de Estômbar e de Lagoa, o que é preocupante.

O que gostaria ainda de ver no concelho em termos de investimentos?
Gostaria de ver indústrias não poluentes, nomeadamente na área das novas tecnologias, oferta de mais serviços, associados ou não ao sector do turismo, e uma ainda melhor oferta turística. O grande risco existente no Algarve é a monocultura do turismo de sol e praia. O concelho de Lagoa está a lutar contra essa situação. Há uma forte promoção da marca Lagoa nos mercados turísticos internacionais, o que é bastante relevante.

Vê qualidade nos jovens políticos de Lagoa?
Tem de haver sempre a renovação de pessoas ligadas à política. Hoje, as bancadas da Assembleia Municipal de Lagoa estão renovadas e é nesse sentido que a situação prosseguirá. Os partidos estão com essa preocupação. Por outro lado, a Assembleia Municipal Jovem e encontros em que tenho participado sobre empreendedorismo deram-me indicações de que, de facto, os jovens estão mais atentos ao que se passa no seu concelho do que muitas pessoas pensam.


“Tem de haver sempre a renovação de pessoas ligadas à política.
Hoje, as bancadas da Assembleia Municipal estão renovadas.”


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